O menino vem descendo a montanha sozinho. Ele traz uma vara comprida na mão, e nem se pergunta por quê. Ele está sozinho. De vez em quando contempla a própria sombra, talvez para passar o tempo, enquanto caminha às vezes tropeçando, às vezes descendo suavemente olhando para baixo. Cuidado com as pedras. Ele sabe.
O menino é louro, cabelo fininho. Ele brilha quando bate o sol, e o rosto está vermelho de tanto sol e tanto andar. Ele já está andando há um bocado de tempo, e aparecem as primeiras graminhas no chão. Bom, pois contornar as pedras era tarefa difícil, de tantas que havia pelo caminho. Ele estava descalço, se machucava com elas. Mas grama é macio, e dava uma tranqüilidade imensa pisar no macio. Os pés ardiam um pouco também, às vezes escorregava na terra batida do morro, e aí era horrível por não ter onde se segurar. Dava uma sensação de desamparo que parecia uma pré-morte, mas ao silenciar o resvalo do corpo na montanha o coração se calava aos poucos, e a força parecia redobrar à medida que ele se reafirmava vivo.
O sol brilhava cada vez mais denso, o menino sentia o ardor sem se queixar, enxugando em vão o suor dos cabelos com a mão que sobrava. A outra, a da vara, permanecia fechada e inerte, quase esquecida, a vara imóvel que só tremia quando o caminho ficava pior. Mas agora não, as graminhas eram cada vez mais freqüentes, e o menino olhou o sol num relance, feliz. Parecia que ganhava a luz do sol, andando em direção a ela tão confortável com a macieza do chão, recompensa depois de tanta pedra difícil. O impulso foi grande, pulou e sacudiu a vara sem querer, riu alto, quase tropeçou e saiu de velocidade redobrada, rindo com o coração aos pulos do susto do tropeço. Não só do susto, o coração pulava como carneiro livre, e o grande choque de felicidade aconteceu com o telhadinho vermelho: o telhadinho apareceu finalmente, rápido como visão de sonho, e o menino gritou sacudindo os braços – eeeei! eeeei! Gritava para si, para o mundo, correndo livremente já sem medo de tropeçar, a vida, o mundo era ele e todo ele, o chão, o sol, o ar e o telhadinho vermelho, tudo era vida e energia e luz irradiando e emanando do menino.
Um cachorro. A mãe, depois o pai e o irmãozinho pequeno, todos apareceram aos gritos do menino.
Depois foi só alívio, abraço, e perguntas. O menino comia ávido, as mãos nem limpas segurando com força e cuidado o pedaço grande de bolo. A mãe alisa o cabelo com cuidado também, olha comovida, pensa. O resto são perguntas, apenas ela permanece calada. O filho está ali, é tudo que importa. Sobram palavras, cochichos e surpresas, pessoas novas à casa entram, mas o instante único está ali: a mãe contempla o seu filho. Nada mais importa. Ele come e está bem.
Com paciência esperam, ele logo começa a responder as perguntas, mas está cansado, quer dormir e as palavras vêm moles, o olho preguiçoso, a mão suja esfregando o rosto. Bem que a mãe olhou, pegou o menino pelo braço, vem se lavar, menino. E todo mundo tem que ir embora para que o menino possa dormir.
“Esse menino...”, todo mundo pensa.
E a mãe, só ela, fica ao lado do menino vendo ele dormir.